Velhos hábitos.

por,Paulo Crespolini.
Psicólogo, licenciado em Filosofia e Pesquisador em Psicologia Analítica.

“Malas… Quantas malas! Às vezes, é tão difícil abandoná-las, deixar de lado os velhos hábitos, mesmo que estejam penhorando a nossa existência e minando-nos as forças.

Alguns se abagagemcostumam a acumular quinquilharias. Não lhes importam o peso nem a quantidade. Vivem de excessos. Permitem-se definir pelas bugigangas que carregam. Sem o perceber, amontoam entulhos afetivos, discursos superficiais, adulações momentâneas, com o intuito de suprir o vazio da própria alma. Já se habituaram com o triste ‘lugar’ das sobras ou, do contrário, com o excessivo ‘território’ das efemeridades.

De tempos em tempos precisamos visitar as nossas malas existenciais, sobretudo, para descobrir se elas estão nos emancipando ou nos oprimindo, nos infantilizando ou tornando-nos adultos.

As malas podem ser os traumas do passado, as perturbações do presente, os conflitos que parecem insolúveis e as mágoas cultivadas no adubo do ódio. Podem ser tantas outras coisas… Presos a elas ficamos exilados de nós, a ponto de nos perder nos mais variados sofrimentos psíquicos.

É libertador deixar as tralhas para trás, mesmo que seja uma a uma. É compensador esquecê-las ao longo do caminho, carregando o que engrandece, não o que diminui. É reconfortante pertencer a si mesmo, estar cativo à própria consciência (desde que eticamente formada), em vez de deixar-se dominar por pessoas, cargos, posses, prestígio e instituições.

Podemos ter uma série de coisas armazenadas, mas que jamais fizeram parte da nossa história e, ainda assim, insistimos lançá-las sobre as costas, fazendo-as um verdadeiro jugo. Algo que pode custar momentos únicos de felicidade, senão, ao menos de tranquilidade.

Viver de sonhos alheios, mendigando afetos, contentando-se com o resto, só nos faz aprisionados às ninharias, às coisas sem importância. Temos potencialidades inconscientes, herdadas e adormecidas, que precisam sair do fundo de nossas malas, mas que só o poderão fazê-lo quando abandonarmos as bagatelas que teimamos amontoar, guardar e carregar.

A psicoterapia não serve para criar uma realidade ilusória, muito menos uma existência romantizada. Ela existe para que, na viagem da vida, sobrevivamos do essencial, nos despojemos das sobrecargas e não sucumbamos ao adoecimento mental sorrateiro de nossas malas.”

Comentários